A cada manhã, um clique. Reiniciar o sistema. Francisco desce as escadas para mais tarde subir. Francisco sai pelo portão para mais tarde entrar. Entra no ônibus para depois sair. Trabalha para se sustentar. Come para não morrer. Dorme para trabalhar. Reiniciar.
Passou pela mente de Chico que vinte e cinco anos se passaram com o mesmo dia, todos os dias. Passou pela mente de Chico que a vida não podia ser aquilo, mas era.
A cada hora, um clique. Planejar. Francisco desce as escadas para nunca mais subir. Sai pelo portão para nunca mais entrar. Anda, anda, anda.
Bom dia, senhoras e senhores. Isso é um assalto. Joguem todos os seus pertences nesse tapete que ninguém vai sair machucado. Eu não tô aqui pra atirar em ninguém.
Corre, corre, corre.
Clique. Planejar.
Boa tarde, senhoras e senhores. Isso é um assalto. Joguem todos os pertences nessa sacola. Isso, celular também. Motorista, próximo ponto.
Clique. Planejar.
Boa noite, senhoras e senhores, isso é um assalto. Joguem todos os.
Corre, corre, corre.
Clique.
Desligar o sistema?
Sim.
sexta-feira, 30 de julho de 2010
terça-feira, 27 de julho de 2010
Pressa
Não tão rápido, disse ao motorista. Não to com pressa, Osmar, pode ir devagar. O carro ia deslizando pelas ruas tranquilas da área nobre da cidade, e a senhora falando ao telefone no banco de trás. As ruas tranquilas da área nobre da cidade, e o carro deslizando sobre o asfalto bem cuidado. Ao fim da rua, uma avenida movimentada, mas não congestionada. Vermelho. Os faróis do freio do carro da frente e o sinal de trânsito. Verde. As folhas das árvores da praça e o carro acelerou. Devagar, Osmar. E devagar o carro passou para a avenida movimentada, mas não congestionada. Vinte minutos e o carro encostou, parou, e a senhora desceu, ainda ao telefone. Entrou no prédio alto, bonito, coberto por vidros azuis. Osmar, me busque às cinco.
Osmar entrou no carro. Não, dessa vez não estava dirigindo devagar. Madame não estava com pressa, mas Osmar sim. Antes de sair de carro com a patroa, soubera pelo celular, que seu filho, que andava pelas ruas tranquilas da área nobre da cidade, indo para seu trabalho de jardineiro, fora atropelado por um motorista cujo patrão estava com pressa. Rápido, Chico! Não temos tempo pra socorrer esse vagabundo! Meu vôo é em quarenta minutos!
Osmar estava com pressa e chegou ao hospital às três.
Não tão rápido, disse às lágrimas. Ainda não sei como ele está.
Vermelho.
Verde.
As lágrimas desceram pelo rosto.
Osmar não estava mais com pressa, mas as lágrimas sim.
Cinco horas e o celular tocou.
Osmar, você está atrasado. O que aconteceu?
Osmar entrou no carro. Não, dessa vez não estava dirigindo devagar. Madame não estava com pressa, mas Osmar sim. Antes de sair de carro com a patroa, soubera pelo celular, que seu filho, que andava pelas ruas tranquilas da área nobre da cidade, indo para seu trabalho de jardineiro, fora atropelado por um motorista cujo patrão estava com pressa. Rápido, Chico! Não temos tempo pra socorrer esse vagabundo! Meu vôo é em quarenta minutos!
Osmar estava com pressa e chegou ao hospital às três.
Não tão rápido, disse às lágrimas. Ainda não sei como ele está.
Vermelho.
Verde.
As lágrimas desceram pelo rosto.
Osmar não estava mais com pressa, mas as lágrimas sim.
Cinco horas e o celular tocou.
Osmar, você está atrasado. O que aconteceu?
sexta-feira, 23 de julho de 2010
A Última Gota
A última gota de chuva caiu do topo da árvore nos cabelos de Catarina, mas Catarina não percebeu. Correu, gritou e pulou em cima do cão dócil, brincalhão. Riu sozinha, enquanto o cão corria para pegar o graveto que ela jogara. O seu sorriso não era falso. Era de extrema felicidade. Plena, pura alegria.
Catarina tinha seis e o cão, cinco. Juntos cresceram em sintonia. Juntos corriam. Juntos brincavam. Latidos e risadas. Pés e patas. Pele e pêlo. Quatro olhos castanhos, quatro ouvidos atentos à chamada. Almoço para ambos. Rápido, rápido, que é pra gente voltar a brincar. As nuvens voltaram enquanto comiam, e choveu. Catarina logo adormeceu no sofá e o cão, companheiro, também. Duas horas e a chuva continuava. Anoiteceu e acordaram. Amanheceu e acordaram novamente. Parara de chover, que bom! Vamos brincar! Correram para o quintal. A última gota de chuva caiu do topo da árvore nos pêlos do cão, mas o cão não percebeu.
Catarina tinha seis e o cão, cinco. Juntos cresceram em sintonia. Juntos corriam. Juntos brincavam. Latidos e risadas. Pés e patas. Pele e pêlo. Quatro olhos castanhos, quatro ouvidos atentos à chamada. Almoço para ambos. Rápido, rápido, que é pra gente voltar a brincar. As nuvens voltaram enquanto comiam, e choveu. Catarina logo adormeceu no sofá e o cão, companheiro, também. Duas horas e a chuva continuava. Anoiteceu e acordaram. Amanheceu e acordaram novamente. Parara de chover, que bom! Vamos brincar! Correram para o quintal. A última gota de chuva caiu do topo da árvore nos pêlos do cão, mas o cão não percebeu.
quinta-feira, 22 de julho de 2010
Queda Livre
O ruído do metrô o incomoda, assim como o nissei falando em japonês com a mãe ao telefone. Ele levanta e vai para o fim do vagão. O ruído continua. Três estações. Duas. Uma. Ele desce do trem e se encontra com ela do lado de fora da estação. "Oi", um beijo fraco, constrangedor. "Oi, chegou tarde", três minutos de atraso, em uma relação morna, é tarde. "Tem tempo, não tem?" Relógio. "Tem".
Andaram e chegaram a tempo. O espetáculo começou e acabou. Todos riram, menos os dois. Saíram e no restaurante comeram. "A conta, por favor." 150 reais. "Meio a meio?" Suspiro de não-aguento-mais. "Pode ser." Saem os dois.
Carro,
rua,
avenida,
precipício.
Andaram e chegaram a tempo. O espetáculo começou e acabou. Todos riram, menos os dois. Saíram e no restaurante comeram. "A conta, por favor." 150 reais. "Meio a meio?" Suspiro de não-aguento-mais. "Pode ser." Saem os dois.
Carro,
rua,
avenida,
precipício.
segunda-feira, 19 de julho de 2010
Arroz Sem Sal
O arroz não tinha sal e ele não se conformou naquele momento, mas logo esqueceu. Ficara quinze minutos na fila pro bolinho de arroz não ter sal. Só isso, era amostra grátis. Estava então andando, sendo puxado por ela para saírem logo da parte japonesa da cidade. Ouvia coisas como vamos logo! Estamos atrasados! Você e seu maldito bolinho de arroz. Dizia que não sabia que estaria sem sal e ainda temos dez minutos! E é logo ali.
Um, dois, três, quatro cruzamentos, quatro sinais fechados e oito minutos. O prédio era grande, de escritórios. Dois minutos e estavam no horário exato da consulta. Revistas de decoração com ela e automobilísticas com ele. Três minutos e ela cochichava um absurdo psicóloga atrasar, cê num acha? Não.
- Bom, por que vocês estão aqui?
- Porque a gente não se entende mais. Cinco anos e não tem mais um dia sem briga. Ainda agora por exemplo ele tava discutindo comigo na sala de espera porque... porque...
- Porque ela disse que era um absurdo a senhora atrasar a consulta.
- Fernando! Por que você inventa essas coisas? Não falei nada disso, doutora. A gente tava discutindo por outro daqueles motivos irrelevantes que ele sempre insiste em discutir. Nem lembro mais. A questão, doutora, é que.
- Bom, por que vocês estão aqui?
- Porque a gente não se entende mais. Cinco anos e não tem mais um dia sem briga. Ainda agora por exemplo ele tava discutindo comigo na sala de espera porque... porque...
- Porque ela disse que era um absurdo a senhora atrasar a consulta.
- Fernando! Por que você inventa essas coisas? Não falei nada disso, doutora. A gente tava discutindo por outro daqueles motivos irrelevantes que ele sempre insiste em discutir. Nem lembro mais. A questão, doutora, é que.
Morcegos
Morcegos rodeiam meu ventilador de teto,
Mas não gostam de sangue.
Não gostam de sangue e parecem não gostar de nada.
Só pedem,
Suplicam
Por alguma coisa.
E voam incessantemente.
As janelas estão abertas
Mas eles preferem ficar aqui dentro.
Pergunto-lhes o que querem.
Não há resposta.
Estupidez pensar ser um sonho-fábula.
Estão ali.
Só sei que pedem.
Ora, o que mais fariam ali?
Apago a luz
E os dois se matam.
Mas não gostam de sangue.
Não gostam de sangue e parecem não gostar de nada.
Só pedem,
Suplicam
Por alguma coisa.
E voam incessantemente.
As janelas estão abertas
Mas eles preferem ficar aqui dentro.
Pergunto-lhes o que querem.
Não há resposta.
Estupidez pensar ser um sonho-fábula.
Estão ali.
Só sei que pedem.
Ora, o que mais fariam ali?
Apago a luz
E os dois se matam.
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